segunda-feira, 18 de julho de 2011

Uma história com sabor a praia e mar e um arroz de goraz


Eram três. Maria, Joana e Manuel. As férias grandes de verão traziam-nos durante três semanas até à casa dos avós maternos no Algarve. A casa ficava junto à praia. Tinha dois pisos e estava pintada de branco. As janelas eram sublinhadas por uma barra azul e pequenos vasos, presos à parede, com sardinheiras vermelhas. Uma cerca de madeira, também pintada de branco, dava a volta a casa, cortada apenas por um portão situado em frente à entrada principal. Dentro da cerca, um pequeno jardim com canteiros de flores, duas laranjeiras, uma figueira e três pés de videira que cresciam por uns paus de madeira e cobriam todo o espaço junto às escadas para a açoteia. Era ali que muitas das vezes as crianças brincavam ao final do dia, à sombra, debaixo de grandes e maduros cachos de uvas. Ou se deliciavam com os figos maduros e doces que apanhavam da figueira.

Maria era a mais velha, Joana a irmã do meio e Manuel o mais novo. Tinham de diferença entre si, precisamente três anos. Manuel, muitas vezes tinha que recorrer ao choro e a muitas lágrimas gordas e salgadas para fazer valer as suas vontades. Mas a idade em certas alturas é um posto e as irmãs acabavam por ceder.

Os dias de verão eram marcados por uma rotina. De manhã ida à praia bem cedo. Uma ou outra vez a avó e a criada Teresa, que os pais faziam questão que os acompanhasse, levavam-nos à água. Mas o que gostavam mesmo era de brincar na areia.

Com as suas pás, baldes e formas de diversos feitios, construiam castelos onde ora, vivia uma princesa bonita presa a um feitiço e por isso nunca podia sair do castelo durante o dia, ou uma terrível rainha, de olhar de limão azedo, que aprisionava todas as crianças gordas e rechonchudas que depois transformava em pequenos sapinhos amorosos com que adorava brincar. Construíam também fortes cheios de especiarias e tesouros que nem o Capitão Gancho sonharia, barcos com velas rasgadas pela força do vento, piratas trapalhões com pernas de pau e que não sabiam assobiar, sereias que cantavam doces melodias e adormeciam os marinheiros num sono tão profundo que deixavam os seus barcos naufragar, baleias gigantes e peixes coloridos que nunca viram.

Depois do almoço, dormiam a sesta e os seus sonhos eram povoados de aventuras com sabor a mar. Manuel, sonhava sempre que era um valente marinheiro, destemido e forte, e que tinha que salvar as suas irmãs que imprudentemente se envolviam em sarilhos.

Para além das doces brincadeiras de sonho na areia, riam de contentes quando o seu avô António os levava à pesca. O avô preparava as canas, os anzóis e o isco, e cada um deles levava um baldinho para trazer o seu peixe ou uma ou outra amêijoa que apanhassem na Ria Formosa. Aqueles passeios com o avô à pesca eram mágicos. Mas mais mágico ainda era quando regressados a casa, o avô António ia para a cozinha e preparava uma deliciosa refeição com o peixinho que apanhava.

Maria, Joana e Manuel, cresceram, tiveram filhos e o avô António já partiu. Mas acreditam que ainda se recordam com um sorriso nos lábios daquelas férias de verão e da receita de peixe do avô, feita agora em ocasiões especiais.


Ingredientes:
1kg de goraz
2 cebolas
3 dentes de alho
1 colher de chá de colorau
3 tomates maduros
2 folhas de louro
1,5dl de azeite
sal e pimenta
400g de arroz carolino
água quente (aprox. 1,2L)


1. Cortar o goraz às postas e polvilhá-lo com sal.

2. Num tacho, levar ao lume médio, o azeite e refogar as cebolas cortadas às rodelas ou em meias-luas, os alhos esmagados, as folhas de louro e o colorau.

3. Depois da cebola quebrar, adicionar o tomate picado limpo de peles e sementes. Deixar ferver até ficar quase em puré. Temperar com sal e pimenta.

4. Juntar 2,5dl de água quente. Quando levantar fervura adicionar as postas de goraz. Assim que cozido retirar as postas e reservar.

5. Acrescentar a água e adicionar o arroz. Rectificar os temperos.

6. Servir o arroz com as postas de peixe.


Este arroz fica uma delícia. O tomate faz toda a diferença. A receita encontrei-a no livro Receitas Portuguesas de Francisco Guedes.

Com esta história e este saboroso arroz de tomate e peixe, participo na festa do terceiro aniversário do figo lampo.

Margarida, muitos parabéns!

[ Published in English as A story with a zest of beach and sea and a tomato and bream rice ]

10 comentários :

moranguita disse...

que belas historias que belos tempos nao e mesmo? o arroz também esta muito bom!!!
boa semana

Susana Antunes disse...

Adorei esta tua história...
Uma excelente maneira de celebrar o mês dos três...
Obrigado por a partilhares...
E o arroz... simplesmente fantástica...
Beijinhos e boa semana...

Margarida disse...

Nós também somos três. Três netos dos avós maternos. Tal e qual como esses. : ) Adorei a participação! Obrigada.
beijinhos grandes

Isabel Salvador disse...

Amiga que bela história quem me dera saber escrever assim tão bem, bela participação...bjokinhas grandes

Anónimo disse...

que maravilha (a história e o prato)
bjs
Mané
http://obolodatiarosa.blogspot.com

Ana disse...

Que bonita história.
O peixinho tem óptimo aspecto.
beijinhos

Susana disse...

Bela história! Sao esses maravilhosos momentos que guardamos com amor no coração e por mais momentos dificeis que passamos esses sobrepõem-se sempre.
Excelente peixinho com sabor a mar. Parabens pela participação.

Beijinhos

Gisela disse...

Uma excelente história para acompanhar um peixe que eu adoro, goraz.
Um beijinho

Diana disse...

Olá, Isabel!!Adorei o seu blog, as receitas estão maravilhosas!! Temos algo em comum-Portugal, o fato de ser professora(sou de literatura portuguesa e brasileira)e tb meu avô (já falecido) era Português!! Além de tudo isso,adoro bacalhau!!Estive em Portugal no ano passado ( fui a Lisboa,Sintra, Cascais,Estoril, Mérida...) E foi um festival gastronômico!! Degustei bacalhau de todo modo- com natas, com batatas ao murro, assado...tudo regado a muito azeite de oliva!D e l í c i i i a!! Mas, o " Amor de Perdição" foram os doces!! Toucinho do céu, pasteizinhos de belém, de natas, e os deliciosos travesseiros da Piriquita!! De babar!!! Desculpe a empolgação, falei demais! A primeira vez é sempre assim!! Sucessos, Bjs, Diana.

P.S. Visite meu blog, vc irá gostar!! http://degustarleresonhar.blogspot.com

Mané o bolo da Tia Rosa disse...

e lá fui eu participar http://obolodatiarosa.blogspot.com/2011/07/biscoitos-de-alfarroba-e-amendoa-para.html
Beijinho